O TEMPO
11:32:00
Atrasada.
Era assim que se sentia. Desde cedo era confusa. Não se decidia e em poucos casos se mantinha
firme em algo. Perante algumas escolhas desistiu, largou mão ou empurrou com a
barriga. Em outras tomou a frente, se destacava e ia até o fim, com êxito, mesmo se questionando.
A
vida passou e se via com 24 anos, ali, estralados em cabelos brancos novatos no
emaranhado de cabelos pretos. Uma colega, da
mesma idade, esbanjava a felicidade ao estar casada e com um bebê recém-nascido.
Outros mantinham a vida de solteiro e se exibiam alegremente, iguais crianças
que ganha o Iphone 7 mas mal sabem utiliza-lo, mas o tinham. Um colega estava
voltando de um intercâmbio e logo arrumou um emprego em uma multinacional.
Inúmeros amigos já haviam ganhado carro dos pais assim que se formaram. Outros
mantinham a vida simples, mas estavam no emprego dos sonhos. Outras conhecidas
mantinham a vida de dondoca com as melhores roupas, melhores passeios e um
futuro promissor.
Ao
se olhar no espelho, e se arrumar para ir ao noivado de seu irmão mais velho, o
sentimento frio e angustiante continuava latente, o de se sentir pra trás. Não
concluirá a faculdade. Estava tentando sanar suas crises ansiedade com Floral
(que de nada adiantavam). Andava de bicicleta e a pé para tudo quanto é lugar,
pois carro era questão de meritocracia em sua família. Sem noivo, namorado,
marido e filhos e ainda sem ânimo para homens que mais pareciam moleques. Não
curtia mais beber. E locais aglomerados com som alto não lhe satisfaziam mais.
Ou seja, vida social, zero. O dinheiro já não lhe pertencia, lhe fora tirado até que desse
“rumo” na sua vida. Vaidades de menina, lhe foram atiradas, assim. Não lhe fora
oferecida a escolha da indecisão ou do questionamento.
Já
arrumada espera no ponto de ônibus atônita, quando um homem todo de
preto de barba malfeita com 40 anos de idade, aproximadamente, cabisbaixo e com
uma cerveja na mão se aproxima. Ela olha para todos os lados caso precise pedir
socorro e não encontra ninguém.
Ele
se aproxima chorando e a diz:
“Eu já fui muito equivocado, sabia? Logo que sai do Ensino Médio corri
para o primeiro curso que acreditei que me satisfaria. Me formei em administração,
curso do qual eu odeio, e me apaixonei por uma colega de classe. Com 6 meses
de namoro já a pedi em casamento. Para que esperar não é mesmo? A pressa me
proporcionou momentos felizes, até então. Via todos os meus amigos indecisos e
me vangloriava, pois tinha tudo o que eles queriam. Carro bom, um emprego que
me pagava bem, uma bela casa e uma linda mulher. Meu casamento começou a esfarelar por nossas pequenas divergências, antes não conhecidas. E para complicar mais a situação descobri
que minha mulher estava grávida. As brigas começaram a se intensificar. Mal
sabendo o sexo da criança já comecei a decorar o quarto do bebê. O enxoval eu
também fiz. No dia em que a bolsa estourou eu entrei no carro e dirigi como um
louco. Acordei em uma cama de hospital com 2 médicos a minha volta e 3
enfermeiras. Meu carro capotou. Minha mulher morreu com o nosso bebê e eu
fiquei vivo para conviver dia a dia com meu remorso. Tive tanta pressa de me formar,
de ter bens materiais, de me sobrepor aos meus amigos e agora tenho todo o
tempo do mundo, alias sempre o tive, porém agora estou sozinho. Hoje em dia meus colegas estão constituindo família e
conseguindo tudo o que um dia eu tive antes, só que aos poucos. O tempo e a pressa são
tão relativos né?!”
O
ônibus chega, antes de entrar ela o abraça fortemente e só diz: “OBRIGADA!”
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