DE MÃOS DADAS...

10:07:00


Mariana chegava sempre primeiro na escola. Assim evitava os olhares. Por seu cabelo ser muito volumoso a professora preferiu que sua carteira diária fosse a última da sala. Sempre gostou de ler histórias, mas quando era necessário ler em voz alta perante os outros alunos, seu coração congelava, lia errado e com as risadas dos alunos, as lágrimas caiam e pingavam no caderno. No recreio encontrou no banheiro seu abrigo. Ali, ninguém a incomodava. Sempre repetia as refeições oferecidas na escola porque a tarde não sabia se haveria o lanche em casa. Em um dia qualquer, enquanto estava na sala, a professora apresentou Nina. Era a nova aluna. A carteira de Nina ficava ao lado de Mariana, no fundo da classe. Nina escreveu um bilhete à Mariana, que estranhou. “Oi. Quer ser minha amiga?”. Mariana não respondeu e começou a abrir o caderno para estudar Português, no caso, sua matéria favorita. Na hora do intervalo, Nina abraçou Mariana e ofereceu metade de seu lanche para dividirem. Mariana aceitou, mas se manteve calada, nunca ninguém havia conversado com ela, nem a chamado para brincar, muito menos oferecido a própria comida. Já sentadas no meio pátio, Nina abriu um livro. Era “O Escaravelho do Diabo”. Mariana já tinha o lido três vezes junto com outros que conseguia roubar da biblioteca da escola. Os seus preferidos eram os de mistério e, aparentemente, os de Nina também. Nina foi se aproximando aos poucos de Mariana e, após muita insistência, se tornaram melhores amigas. Mariana se tornou mais confiante quando era preciso ler em voz alta. Começou a participar mais das aulas e a ganhar destaque com melhores notas. Começou a frequentar o intervalo no meio dos outros alunos, mas sempre com Nina. As duas se tornaram uma só. No Dia do Índio combinaram de ir com penas que combinavam. No Dia do Meio Ambiente, Nina foi de verde representando as folhas e Mariana de marrom representando o tronco das árvores. No dia do Halloween uma maquiou a outra com bastante ketchup imitando sangue. Já no primeiro dia da Semana da Consciência Negra as duas se olharam, se abraçaram como nunca antes, deram as mãos e, pela primeira vez, por escolha, foram as últimas a entrarem na sala encarando a professora e cada um dos colegas de classe.


RUUD VAN EMPEL

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